Tormented Souls 2 – Análise

Pierry Lima (@Pierry8Bit)
Pierry Lima (@Pierry8Bit)

Minha experiência com o primeiro Tormented Souls foi, com toda a certeza, uma das melhores que tive com um jogo de terror lançado nos últimos anos. Momentos de tensão, puzzles desafiadores e momentos que me fizeram repensar se havia algo errado comigo, reacenderam a chama que uma vez foi plantada por Resident Evil em meu coração. Quando recebi a agradável notícia que teríamos um novo capítulo desta macabra história, minhas expectativas chegaram até a Lua, e aos poucos tive a certeza que confiar no trabalho da Dual Effect foi certeiro. Tormented Souls 2 é o tipo de jogo que deixa claro, logo nas primeiras horas, que não foi feito para agradar todo mundo. Ele exige tempo, atenção e uma certa disposição para aceitar o desconforto como parte essencial da experiência. Em vez de suavizar arestas ou modernizar sua proposta, o game escolhe aprofundar suas raízes no survival horror clássico, refinando ideias já apresentadas no primeiro jogo e expandindo sua identidade própria.

Mais do que apenas uma continuação, Tormented Souls 2 funciona como uma afirmação de maturidade criativa. O estúdio demonstra ter entendido o que funcionou antes, o que precisava ser ajustado e onde havia espaço real para evolução.

Reprodução: Autor

Consequências

Em Tormented Souls 2, a história assume um papel mais direto e funcional do que no jogo anterior. A trama volta a acompanhar Caroline Walker, agora marcada física e psicologicamente pelos acontecimentos do primeiro título. Longe de encontrar paz, Caroline se vê forçada a retornar ao epicentro do horror quando antigos crimes ligados a fanatismo religioso, experimentos humanos e tentativas de controlar a vida e a morte começam a ressurgir.

O motor da narrativa é claro: o mal persiste porque nunca foi devidamente enfrentado. As instituições e figuras responsáveis pelos abusos do passado deixaram cicatrizes profundas, e o sobrenatural surge como consequência direta dessas ações. Criaturas, rituais e distorções do ambiente não existem por acaso, mas como manifestações de culpa, violência e tentativas fracassadas de apagar erros históricos.

Diferente do primeiro Tormented Souls, que apostava fortemente no mistério fragmentado, o segundo título da franquia organiza melhor suas informações. Documentos, símbolos e encontros pontuais nos ajudam a compreender por que os eventos estão acontecendo e por que Caroline é novamente peça central desse ciclo de sofrimento. Ainda assim, o jogo evita explicações excessivas, preservando o clima psicológico e perturbador.

Sem recorrer a grandes reviravoltas expositivas, Tormented Souls 2 constrói um enredo mais coeso e integrado à jogabilidade. Sobreviver deixa de ser o único objetivo; interromper um ciclo de dor que insiste em se repetir passa a dar sentido a cada avanço na história.

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O terror como sensação contínua

Se existe um elemento que define Tormented Souls 2, é sua atmosfera. O jogo constrói o medo de forma gradual, quase paciente, apostando menos em sustos repentinos e mais na antecipação constante. O desconforto nasce da dúvida: entrar ou não naquela sala, atravessar ou não aquele corredor longo demais, avançar sabendo que algo pode acontecer – ou talvez não.

O design de som é um dos grandes destaques. Ruídos metálicos, passos distantes e sons abafados criam uma paisagem sonora inquietante. Diferente de muitos jogos modernos, Tormented Souls 2 entende que nem todo som precisa ser explicado ou localizado com clareza. Muitas vezes, você escuta algo e simplesmente não sabe de onde vem – e isso é proposital. Sons surgem lateralmente, atrás do jogador, criando tensão mesmo quando não se vê nada na tela. A trilha sonora é minimalista e bem dosada, surgindo apenas quando necessário. Em muitos momentos, o jogo confia no silêncio absoluto para gerar medo, e essa escolha se mostrou extremamente eficaz.

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Decadência que conta histórias

Visualmente, Tormented Souls 2 mantém e aprofunda a estética decadente do primeiro jogo. Os cenários são opressivos, detalhados e carregados de narrativa ambiental. Cada sala parece ter sido abandonada às pressas, como se algo terrível tivesse interrompido a rotina daquele lugar.

A direção de arte é coesa e confiante. A iluminação trabalha em conjunto com a câmera para esconder informações, criar enquadramentos desconfortáveis e guiar o olhar do jogador de forma sutil. Há sequências visualmente marcantes que ficam na memória.

Tecnicamente, o jogo apresenta algumas imperfeições. Nem todos os modelos e efeitos de iluminação exploram todo o seu potencial, e isso fica mais evidente – por motivos óbvios – em comparações diretas com outros projetos do gênero. Ainda assim, essas limitações raramente quebram a imersão, já que o conjunto da obra é forte o suficiente para sustentar essa experiência macabra.

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Evoluindo sem abandonar a essência

A jogabilidade de Tormented Souls 2 mostra uma clara evolução em relação ao primeiro jogo, especialmente no refinamento dos controles e no equilíbrio geral das mecânicas. A filosofia, no entanto, permanece a mesma: sobreviver é mais importante do que enfrentar.

O combate continua tenso e deliberadamente limitado. Munição é escassa, inimigos são resistentes e cada confronto deve ser cuidadosamente avaliado. Diferente de muitos jogos atuais, aqui o combate não é recompensador por si só. Ele existe como obstáculo, não como um espetáculo.

Comparado ao primeiro game, os controles estão mais responsivos e menos punitivos em situações específicas, sem perder a rigidez proposital que reforça a vulnerabilidade da protagonista – apesar de ainda incomodar o delay para movimentar Caroline ao entrar em uma sala, o que acabou me custando alguns itens de cura.

A exploração segue sendo um dos pilares do jogo. O mapa é construído para incentivar revisitas constantes, e o jogador precisa memorizar caminhos, portas trancadas e símbolos recorrentes. Essa estrutura pode afastar os mais impacientes, mas recompensa quem aprecia exploração meticulosa.

O ritmo geral de Tormented Souls 2 é bem controlado, alternando exploração, puzzles e confrontos de forma equilibrada. O backtracking continua sendo parte importante da estrutura e, embora em alguns momentos se estenda além do ideal, ele faz sentido dentro da proposta do jogo.

Comparado ao primeiro título, a progressão é mais fluida e menos truncada, ainda que não totalmente isenta de quedas de ritmo pontuais.

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Eu sou péssimo em astronomia

Os puzzles seguem a tradição do survival horror e estão totalmente integrados ao ambiente e à progressão narrativa. Resolver enigmas exige observação, interpretação de pistas e compreensão do espaço, reforçando a sensação de investigação constante.

Há desafios mais inspirados e outros mais tradicionais, mas o equilíbrio geral é positivo. Diferente de muitos jogos modernos, Tormented Souls 2 raramente oferece dicas explícitas, confiando na atenção e na memória do jogador.

É importante notar como esses elementos de jogabilidade dialogam diretamente com o enredo. Cada chave encontrada, cada sala reaberta e cada puzzle resolvido não servem apenas para destravar progresso, mas para reforçar a ideia de retorno e repetição. O jogo faz o jogador reviver espaços e ações da mesma forma que sua protagonista é forçada a reviver traumas que nunca foram resolvidos. Em alguns momentos me senti angustiado, de tal maneira que não consegui entender, mas conforme avançava nos cenários, uma pequena sensação de orgulho pelas minhas realizações era notória. O game me estimulava e eu prontamente respondia, era quase que uma conexão impossível de não acontecer.

Conclusão

Tormented Souls 2 é um survival horror que entende que medo não nasce do excesso, mas da persistência. A experiência constrói tensão de forma gradual e mantém o jogador constantemente vulnerável, tanto mecanicamente quanto emocionalmente.

A evolução em relação ao primeiro jogo é clara. A jogabilidade está mais refinada, os puzzles melhor distribuídos e a narrativa mais compreensível, sem abandonar o mistério que define a identidade da série. Mais do que simplesmente sobreviver, o jogo dá peso narrativo a cada passo, transformando a progressão em um confronto direto com erros do passado.

O enredo, agora melhor integrado à exploração e ao design de níveis, reforça a ideia de que o horror existe porque foi alimentado. Cada criatura, ritual ou distorção do ambiente é consequência de escolhas humanas, e Caroline Walker deixa de ser apenas uma vítima para se tornar alguém que precisa encarar essas consequências de frente.

Com falhas pontuais, mas uma proposta sólida e coerente, Tormented Souls 2 se firma como uma das experiências mais interessantes do terror recente. É um jogo que não busca conforto, e exatamente por isso permanece na memória muito depois do último corredor escuro.

Esta análise é baseada na cópia de PS5 fornecida pela PQube.

Tormented Souls 2
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