Keeper – Análise

Gabriel Kreyssig Romualdo (@budabytett)
Gabriel Kreyssig Romualdo (@budabytett)

Ah, a Double Fine. Conhecida por títulos como Psychonauts e Brütal Legend, e adquirida pela Microsoft em 2019, o estúdio liderado pelo lendário Tim Schafer é certamente um dos mais criativos da indústria. Mesmo com orçamentos limitados, a desenvolvedora sempre produziu verdadeiras e divertidas obras de arte.

Desde sempre, a Double Fine vem incentivando a criação e o fomento de ideias por meio do projeto Amnesia Fortnight, no qual pequenas equipes internas desenvolvem protótipos em um curto período. O divertidíssimo Costume Quest, por exemplo, surgiu desse momento de criatividade dos desenvolvedores – e, embora isso não esteja confirmado, não tenho dúvidas de que Keeper, o mais novo título do estúdio, também fez parte de um processo similar.

Desenvolvido sob o comando do veterano Lee Petty – diretor de arte de Brütal Legend e Broken Age, e atual líder criativo do estúdio –, Keeper foi apelidado carinhosamente como “jogo do farol” pela comunidade. Nesta análise, iremos abordar o que torna essa aventura de um farol e uma ave marinha rumo ao incompreensível tão especial.

O silêncio traz a mensagem que cada um precisa ouvir

Keeper se inicia com a perseguição de uma bizarra nuvem negra (conhecida como Definhação) a uma ave marinha chamada Ramo. Fugindo do perigo, Ramo pousa sobre um farol abandonado, que então desperta e afasta a Definhação com um raio de luz. O Farol, em seguida, cai ao chão e cria pernas, passando a andar de forma desengonçada junto à misteriosa ave que o acompanha.

A partir daí, passamos a nos aventurar por diversos cenários exuberantes de um mundo que, mesmo em ruínas, parece vivo, tomado pela natureza e por animais místicos. Durante a jornada, presenciamos momentos de viagem no tempo que revelam um pouco das diferentes eras dessa misteriosa civilização.

Um farol aparentemente abandonado / Reprodução: Divulgação

O jogo se destaca por expressar sentimentos sem utilizar uma única palavra. Não há falas ou rostos definidos, e mesmo assim, a Double Fine conseguiu, com maestria, tornar o Farol um ser expressivo, revelando seus sentimentos junto à ave por meio de movimentos e reações físicas a determinados acontecimentos – além, é claro, de seus efeitos sonoros. Um exemplo muito bonito disso é quando o Farol e Ramo se separam por um instante, e sua luz se apaga, demonstrando tristeza. Ao reencontrar seu amigo, o Farol acende novamente, deixando clara sua felicidade.

Keeper é uma linda jornada introspectiva. Cada jogador absorverá a experiência de uma forma diferente, mas há uma clara mensagem principal de esperança, amizade, transformação e até mesmo de “humanidade” – mesmo que não haja sequer um humano durante toda a experiência. Por diversas vezes me peguei sorrindo durante as interações do Farol com Ramo, uma amizade orgânica e desenvolvida de forma natural, sendo muito bonita de se acompanhar. É aquela típica experiência que a Double Fine sabe fazer muito bem, mesmo sem o envolvimento direto de Tim Schafer. Fico feliz em ver que o estúdio está em boas mãos e espero que nada de mal aconteça – vocês sabem bem do que estou falando.

O Farol e a ave Ramo / Reprodução: Divulgação

Iluminando o caminho

Como era possível notar pelo conteúdo divulgado até então, Keeper é um simples jogo de aventura. Caminhamos por belíssimos cenários e resolvemos puzzles utilizando a luz do Farol, sendo auxiliados pela ave Ramo. Inicialmente, a experiência é linear, mas, conforme avançamos, os cenários se tornam maiores, exigindo um mínimo de exploração por parte do jogador para solucionar os puzzles e avançar para a próxima área.

Porém, Keeper não se trata apenas de um “jogo do farol”. A forma como nosso peculiar protagonista se comporta vai mudando com o decorrer da gameplay. Em certo momento, por exemplo, podemos flutuar, envoltos por nuvens rosas que lembram algodão-doce. Já em outro, ocorre uma mudança tão grande que fiquei surpreso com o quanto a Double Fine arriscou algo diferente em meio a uma experiência que parecia tão “fechadinha” em sua proposta. Não darei spoilers aqui – apenas jogue e se surpreenda!

Leve como um algodão-doce / Reprodução: Divulgação

Prints, prints e mais prints

Keeper não é apenas um dos jogos mais bonitos de 2025, mas um dos mais bonitos que já joguei – e não, eu não estou exagerando. O jogo entrega cores vivíssimas, fazendo bom uso do verde, rosa e azul, e, junto à sua direção de arte espetacular, cria cenários de tirar o fôlego, sendo impossível não parar a cada instante para tirar prints. Ainda no aspecto gráfico, há um incrível trabalho de luz e sombra, bem como texturas muito bem definidas – ainda que conceituais, devido ao estilo artístico. Quem diria que um dos melhores exemplos do potencial da Unreal Engine 5 viria de um título desse porte, hein?

Um dos jogos mais bonitos já feitos, apenas / Reprodução: Divulgação

Mas é claro, você leu “Unreal Engine 5”. O belíssimo gráfico não viria sem um sacrifício: o desempenho. Em seus requisitos recomendados, Keeper exige uma RTX 4080 ou RX 7900 XT, ambas com 16 GB de VRAM, além de um i7-13700K ou Ryzen 9 7900X como CPU. Estou em algo entre os requisitos mínimos e recomendados, e mesmo assim tive dificuldades para executar o game.

Na resolução 1080p, com qualidade “Muito Alto” e “DLSS Qualidade”, passei a maior parte do tempo entre 30 e 40fps, com diversos momentos de quedas para 20fps e, em um dado momento, insanos 9fps. Já no outro extremo, com a qualidade “Muito Baixo”, é possível manter cerca de 45 a 50 fps na maior parte do tempo – mas com um sacrifício notável na parte da iluminação. Embora os 30 quadros não sejam exatamente ruins para um jogo narrativo, é fato que Keeper poderia ser melhor otimizado. Aqueles com hardwares mais modestos ou PCs portáteis – como o Steam Deck – irão sofrer para ter uma experiência digna.

Árvore destruidora de frame rate / Reprodução: Divulgação

É claro, também não poderia deixar de mencionar a trilha sonora de Keeper, que emprega faixas misteriosas adaptadas para fazer sentido com cada cenário que estamos presenciando naquele momento. Sabe quando você quer relaxar e procura por músicas de algum jogo junto à palavra “ambience” na internet? Keeper seria basicamente esse tipo de jogo, oferecendo músicas ambiente relaxantes que podem evocar diversas sensações no jogador, como felicidade, tristeza, medo e esperança. Não há uma faixa que marque profundamente, mas todas são suficientemente boas para acompanhar nossa jornada e satisfazer nossos ouvidos.

Double Fine Entertainment

Mesmo sem palavras, Keeper entrega uma experiência memorável e introspectiva, explorando de forma magistral a amizade entre um farol e uma ave marinha em sua jornada para livrar o mundo da Definhação. Com puzzles interessantes, que se aproveitam muito bem do cenário, e visuais de tirar o fôlego – com ressalvas para a otimização –, Keeper demonstra mais uma vez a qualidade e criatividade da Double Fine, que eu sinceramente espero que continue viva sob os braços da Microsoft.

Esta análise foi baseada na versão de PC disponível no Xbox Game Pass.

Keeper
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